Já no início do jogo Ari Nascimento tinha avisado: “Aconteça o que acontecer vamos sair daqui de peito cheio de orgulho.” É jogador de bola, filho de futebolista da seleção do arquipélago. Falava, pois claro, da campanha da seleção cabo-verdiana nesta Taça Africana das Nações, a CAN 2024. Os Tubarões Azuis tombaram nos penáltis perante a África do Sul e falharam assim o acesso às meias finais da competição.
Mas conseguiram o melhor resultado da sua história e, pelo menos no Luxemburgo, todos os adeptos parecem rebentar de orgulho. “Isto é apenas o início de uma narrativa que estamos a começar a escrever”, avisava Ari. “Se Deus quiser, vemo-nos no próximo Mundial.”
Ari Nascimento acredita que este é apenas o início da história. © Créditos: Ricardo J. Rodrigues
Foi bastante impressionante ver a alegria que reinava na noite de sábado no Café Players, reduto cabo-verdiano da capital. A casa estava tão cheia que as paredes pareciam ferver com o calor dos trópicos e meio mundo tinha trazido cachecóis e bandeiras, camisolas e palavras de ordem.
Uma mulher chamada Fernanda Cruz explicou tudo quando disse isto: “Eu nem gosto de bola, mas a alegria de ver o meu país agigantar-se é uma emoção sem fim. Hoje há cabo-verdianos no mundo inteiro a celebrarem o nosso país por causa destes rapazes. Somos pequeninos, temos mais gente a viver fora do arquipélago do que nas ilhas, mas partilhamos todos o mesmo amor à nossa terra. E é uma coisa tão bonita”, descreveu ela, com o Atlântico a encher-lhe os olhos.
Vieram miúdos e velhotes, rapazes e raparigas, tímidos e extrovertidos. Assim que o árbitro apitou para o início do jogo não interessava idade nem género, feitio ou estatuto social. A única coisa que importava era o orgulho ilhéu. Um ataque sul-africano causava arrepio, uma investida crioula era uma emoção. Conseguirá alguém ser cabo-verdiano sem o coração nas mãos?
Fernanda Cruz, de cor de rosa, com a sua tropa. Todos por Cabo Verde. © Créditos: Ricardo J. Rodrigues
Isto também é verdade: o aperto haveria de durar até ao fim. Cabo Verde perderia o jogo na injusta lotaria das grandes penalidades, mas nem por um momento a multidão desistiu do aplauso. Era apenas isso que a equipa merecia. A noite foi bonita até ao fim em Bonnevoie.
Inevitável morabeza
O cozinheiro de volta da cachupa. João sabe que os cabo-verdianos se conquistam pela música e pelo estômago. © Créditos: Ricardo J. Rodrigues
O povo cabo-verdiano tem uma fórmula para expressar a alegria. A música primeiro que tudo, a arte de juntar gente à volta da mesa logo a seguir, e a boa conversa para rematar. Era isso que acontecia agora no Players Café.
A cachupa ia chovendo para as mesas no meio dos cruzamentos. Trabalho imenso do cozinheiro, de Santiago, João di Codi. Mandava torresmos e pastéis de atum, moela e iscas. “Com grogue é que isto vai bem”, disse com uma gargalhada.
De vez em quando alguém começava entoar uma morna, e Ari Nascimento afirmaria para quem o quisesse ouvir que esta seleção de futebol era o maior ogulho das ilhas depois de Cesária Évora. “Agora temos rapazes a jogar nos melhores campeonatos, e um treinador que os consegue juntar todos”, explicava entusiasmado.
Filipe é português, Hugo é cabo-verdiano, Steve luxemburguês. São os donos do Players. © Créditos: Ricardo J. Rodrigues
De trás do balcão, os donos da casa sorriam. O Players é, desde 2009, propriedade de uma tríade que explica o espírito da casa. Um cabo-verdiano chamado Hugo Gomes, um português chamado Filipe Tavares e um luxemburguês chamado Steve Lauer. Não cabiam em si de felicidade ao longo da noite. Porque o triunfo de Cabo Verde é de toda a gente. Mesmo que, na noite de sábado, tenham perdido.
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