Um país sem governo, dominado pelos gangues e com cadáveres nas ruas. Como o Haiti entrou em colapso – Observador
Prometendo “romper com o sistema” e lutar “até à última gota de sangue”, Chérizier — que aparece sempre em público rodeado de homens armados e com roupas de estilo paramilitar — tem tudo para se tornar um ícone que pode transitar da pura violência para a política. “Ele tem algum carisma, é um pensador, mas também é uma pessoa violenta”, resumiu ao Financial Times o ativista haitiano Louis-Henri Mars.
O que não significa, contudo, que seja o próximo líder a emergir do caos. “Ainda não sabemos se ele irá reinar ou se novos adversários vão tentar destroná-lo, como costuma acontecer quando organizações criminosas se partem”, alerta Carlos Solar. O próprio discurso político de “Barbecue”, apresentando-se como uma espécie de “novo Che Guevara”, não é sólido, alerta Johnston: “Os grupos armados podem ter-se virado agora contra o sistema, mas durante anos contribuíram para perpetuar o sistema. Proclamam a sua oposição à intervenção estrangeira, mas estão a fornecer precisamente uma justificação para ela”, diz o investigador, que lembra como durante anos grupos como o G-9 mantiveram laços com o partido Haitian Tèt Kale, no poder, e outros como o G-Pèp com a oposição.
O uso de forças paramilitares para atingir fins políticos não é nada de novo no Haiti. A polícia política dos Duvalier — os ditadores “Papa Doc” e “Baby Doc”, pai e filho que governaram o país com mão de ferro ao longo de 30 anos — era conhecida como Ton-Ton Macoute (algo que pode ser traduzido como “papões”) e esteve na origem de muitos dos grupos armados que floresceram depois da queda dos Duvalier. Muitos no Haiti queixam-se da ingerência estrangeira, relembrando como os Duvalier foram apoiados pelos Estados Unidos (eram oficialmente anti-comunistas) e como o próprio Ariel Henry, agora, se mantinha no poder com o patrocínio de Washington.
Todo este passado político complexo tem influência na situação de hoje. A comunidade de países das Caraíbas (CARICOM) tem estado a promover a criação do novo conselho de transição, com o apoio claro dos Estados Unidos — o secretário de Estado, Antony Blinken, tem estado presente nas reuniões. Mas o governo americano desdobra-se agora em declarações para garantir que a solução que sair daqui será “desenhada pelos haitianos e liderada pelos haitianos”. “Passámos de 200 anos de Doutrina Monroe e intervenção profunda para liderar à distância”, resumiu o antigo conselheiro para o Haiti Stanislas Wojewodzki, ao Wall Street Journal. “Acho que nenhum Presidente [americano] quer tocar no Haiti nem sequer com um pau de três metros”.
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