A Comunidade de Países de Língua Portuguesa (CPLP) não existe para concertar posições de política externa entre os novos Estados que compõem a organização, sublinha o primeiro-ministro cabo-verdiano. Era “ideal” que os países se pusessem de acordo em matérias tão importantes como a invasão russa da Ucrânia, mas há “interesses políticos” que às vezes fazem convergir e em outras fazem divergir a opinião entre eles.
Comentando à agência Lusa o recente anúncio de um acordo de cooperação militar entre São Tomé e Príncipe e a notícia de que as forças especiais da Guiné-Bissau irão receber formação na Chechénia e que mais de uma centena de oficiais militares guineenses já estão a ser formados na Rússia, Ulisses Correia e Silva foi claro, Cabo Verde condena a Rússia pelo que está a fazer na Ucrânia, mas os outros países da CPLP são soberanos e independentes para assumir posições diferentes.
“A CPLP é uma comunidade de países de língua portuguesa, não tem como objectivo definir a concertação única relativamente a relações externas”, afirmou o chefe do Governo cabo-verdiano. “O ideal era que, de facto, pudesse haver um posicionamento que pudesse reflectir a posição da CPLP, mas não é essa a natureza e missão: são países livres e independentes.”
“O nosso posicionamento foi muito claro e reiteramos: nós condenamos a invasão da Rússia à Ucrânia”, sublinhou Correia e Silva, lembrando as votações do seu país nas Nações Unidas. Agora, a CPLP integra Estados “com interesses políticos que às vezes são convergentes e outras vezes divergentes” e, na questão russa, eles são nitidamente divergentes.
O primeiro-ministro cabo-verdiano, que falava aos jornalistas no Mindelo, na segunda-feira, para fazer um balanço dos três anos do seu segundo mandato de governação, lembrou as “parcerias fortes” que o seu país tem com a União Europeia e com outros aliados de Kiev, como os Estados Unidos. Com os 27, a relação é mesmo “estruturante” em termos sociais, económicos e de defesa e segurança.
“As nossas opções são claras, as nossas acções são consistentes”, acrescentou o governante.
Rússia quer “intensificar relações”
Apesar dessas “parcerias fortes” e da relação “estruturante” de Cabo Verde com a UE e a sua forte ligação aos Estados Unidos, territórios onde vive grande parte da diáspora cabo-verdiana, a Rússia está empenhada em conseguir também aprofundar as suas relações com o arquipélago africano.
“Esperamos desenvolver as relações bilaterais em todos os campos possíveis”, afirmou o ano passado o embaixador russo na cidade da Praia, Yury Materiy, ao apresentar as suas credencias ao Presidente José Maria Neves. Uma relação que Moscovo pretende que seja alargada, da formação de quadros ao fornecimento de cereais.
A acreditação de Materiy, segundo a Lusa, terminou um longo período de dois anos em que a Rússia não teve representante diplomático no país ao nível de embaixador, depois de as autoridades cabo-verdianas terem rejeitado o nome proposto inicialmente por Moscovo, Natalia Poklonskaia, ex-procuradora-geral na Crimeia, a península ucraniana anexada pela Rússia em 2014, por ser visada em termos de sanções internacionais.
Na altura, o embaixador transmitiu uma mensagem clara ao Presidente cabo-verdiano, como referiu aos jornalistas: “O principal objectivo da minha missão aqui é intensificar as relações entre a Rússia e Cabo verde, especialmente na esfera económica e das trocas comerciais, mas também nas pescas, turismo, fornecimento de energia e de cereais”.
“Uma das principais áreas de cooperação a que o Governo da Rússia presta grande atenção é a educação. Estamos a dar formação a Cabo Verde, assegurando bolsas de estudo”, explicou o diplomata na altura. Na altura, mais de 40 estudantes cabo-verdianos estavam a formar-se em universidades russas “sem custos” e Materiy garantia que pretendiam dar bolsa de estudo com alojamento gratuito a mais 14 estudantes de Cabo Verde.
De qualquer maneira, posteriormente às declarações o embaixador, Cabo Verde não participou na Cimeira Rússia-África que se realizou no final de Julho em São Petersburgo, onde 49 dos 54 países africanos estiveram representados com delegações, 17 delas lideradas pelos respectivos chefes de Estado.
Isto apesar de em Junho do ano passado, mais de um ano depois da invasão russa da Ucrânia, o Presidente cabo-verdiano, José Maria Neves, não se ter coibido de enviar uma mensagem calorosa de “vivas felicitações” ao seu homólogo russo, Vladimir Putin, com “votos de saúde” e “prosperidade” e “paz” para a Rússia. Na mensagem, Neves reiterava a vontade de fortalecer os laços de amizade e de cooperação entre Cabo Verde e a Rússia.
Em 2022, chegou a noticiar-se que o Presidente russo visitava regularmente Cabo Verde para ir a banhos. Testemunhas na ilha do Sala davam conta que o Presidente russo saía sempre acompanhado de muitos guarda-costas que impediam a aproximação de quem quer que fosse, mesmo, ou sobretudo, para tirar fotografias.
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