Movimento Eco-Feminismo de Cabo Verde procura criar sinergias entre feminismo e ambientalismo no país
Oriunda de uma família do interior de Santiago, Mónica Rodrigues resolveu criar a ONG, Movimento Eco-feminismo de Cabo Verde, depois de ter trabalhado como comunicadora ambiental e de ter notado que em questões relacionadas às mudanças climáticas, as mulheres eram vistas mais como “vítimas”, em vez de provedoras e detentoras de conhecimento.
Nasceu no concelho de São Lourenço dos Órgãos, no interior da ilha de Santiago, onde a família tinha uma relação próxima com a terra, mas devido à seca e ao falecimento da matriarca da família, Mónica mudou-se com a mãe para a cidade da Praia, onde cresceu e estudou.
Ao longo da sua trajetória, Mónica, hoje com 34 anos, relata, em entrevista ao Balai, que em determinados momentos da vida teve de lidar com situações de discriminação social, algumas das quais de género e também relacionadas com a sua origem (por ser ‘badia’), enquanto outras estavam ligadas ao colorismo e ao assédio, principalmente durante os processos de candidatura para bolsas de estudo no exterior, o que a fez permanecer no país para estudar Relações Públicas e depois concluir um mestrado em Empreendedorismo e Gestão de Negócios.
Em abril de 2019, fundou o Movimento Eco-Feminismo de Cabo Verde, uma organização não governamental (ONG), focada em promover a relação das mulheres com o ambiente, uma iniciativa também impulsionada pelos cenários anteriores que incentivaram o seu interesse pelo ativismo.
O papel das mulheres na luta ambiental
Tudo começou quando Mónica trabalhava como comunicadora ambiental numa ONG de conservação, em Madagáscar, em 2018. Na época, foi distinguida para participar de um programa de investigação em mudanças climáticas e os seus impactos, onde trouxe à tona a questão da integração entre o conhecimento científico e o conhecimento das pessoas locais e indígenas para a adaptação e mitigação face às mudanças climáticas.
“Percebi que, ao falar sobre a literatura ou mesmo sobre questões relacionadas às mudanças climáticas, as mulheres eram vistas apenas como “vítimas”, em vez de provedoras e detentoras de conhecimento”, conta.
Com o movimento, Mónica procura reunir organizações de conservação ambiental, ativistas, instituições governamentais, académicos, ambientalistas e pesquisadores para discutir diferentes questões que afetam as mulheres, assim como os homens, quando se trata do clima e das suas mudanças.
“Antes de criar o movimento, não me considerava feminista, apenas defensora dos direitos humanos e comunicadora. Hoje, desejo unir feministas e ambientalistas e criar a sinergia e a riqueza conceitual tanto do ecologismo quanto do feminismo, tendo em conta a submissão da mulher e da natureza dentro de um sistema patriarcal”, revela.
O desafio de abordar o feminismo em Cabo Verde
Amigos e conhecidos que acompanhavam as atividades da Mónica em Madagáscar a incentivaram várias vezes para criar algo semelhante voltado para Cabo Verde. Até que numa das visitas ao país, em 2019, decidiu lançar um evento na cidade da Praia, para discutir a questão das secas e mudanças climáticas no contexto do arquipélago. Foi nesse evento que nasceu oficialmente o Movimento Eco-Feminismo de Cabo Verde.
Na mesma ocasião, surgiu a oportunidade de promover um evento de networking, o Startup Speed Dating, voltado para projetos sociais, ecológicos e ambientais promovidos por jovens das periferias.
Segundo Mónica, iniciar a promoção dos dois eventos contribuiu para uma boa receção do movimento no país, embora um dos desafios iniciais fosse fazer com que os membros interessados em integrar a organização entendessem a mensagem principal, para que não ficassem apenas em “teorias” e debates conceptuais.
“Muitas vezes, há uma desvalorização, até mesmo nos media, do feminismo e o desejo de focar apenas nos aspetos negativos associados a esse tipo de ativismo. Isso desvia do essencial, que é a luta pela igualdade de direitos e oportunidades entre mulheres e homens em diferentes campos”, lamenta.
Projetos do movimento virados para Cabo Verde
Segundo a mentora do projeto, para Cabo Verde, a proposta inicial foi unir as mulheres e os homens para trabalhar no desenvolvimento psíquico e social das crianças, visando promover um futuro mais sustentável.
“Isso porque, sem trabalhar com os próprios adultos para educar as crianças e conscienciá-las sobre as causas ambientais, estaríamos comprometendo a sustentabilidade de nosso futuro”, esclarece.
Questionada sobre os trabalhos promovidos pela organização até agora, Mónica destaca a criação de clubes de leitura voltados para a capacitação dos membros internos, para que entendam os conceitos e os associem às práticas locais no país de modo a estimular conversas sobre a agenda pública.
“O nosso público-alvo principal são os decisores políticos, a sociedade em geral, os meios de comunicação e os líderes comunitários. Através de conversas abertas, trazemos técnicos de instituições governamentais relacionadas ao meio ambiente e áreas transversais, com grande experiência, para compartilhar com os jovens e promover um diálogo intergeracional”, diz.
Além de atuar na cidade da Praia, o Movimento tem uma delegação em São Vicente que, segundo Mónica, já abordou questões de género relacionadas à migração climática provocada pela seca, como o êxodo rural de Santo Antão e São Nicolau para a cidade do Mindelo.
“Fizemos trabalhos e projetos que destacaram o engajamento das mulheres na construção urbana na cidade do Mindelo. Além disso, promovemos outros projetos também nas ilhas do Sal e da Boavista, com foco no uso racional da água”, destaca.
Atualmente, o Movimento Eco-feminismo de Cabo Verde está em processo de reestruturação enquanto organização e conta com um núcleo de seis pessoas que, embora não estejam ativos nos projetos do movimento, ainda prestam serviços de consultoria e cooperação em projetos de terceiros.
Para a mentora Mónica Rodrigues, um dos principais focos do movimento tem sido a criação de uma elite pensante oriunda das comunidades e a formação de um grupo de apoio às mulheres com foco na emancipação e no empoderamento, independentemente do nível social.
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