A bem da noção Portugal é uma ilha Paraíso clã destino – Rui Zink


Em Portugal todos se conhecem. Portugal é uma ilha, só que de um lado em vez de mar temos a Espanha, que também mete água. Ora a Madeira é um Portugal onde todos se conhecem ainda mais. Os turistas sempre a viram como destino paradisíaco.

A insularidade não é só vantagens, também tem um preço. Desde logo, é mais difícil ser oposição numa ilha. Florescem os clãs. Até questionar o poder se torna mais complicado.

Reza a lenda que Alberto João é o grande responsável por a Madeira ser o Jardim que hoje é, tanto nas coisas boas como nas menos boas. A lenda continua a rezar (como se sabe, as lendas são muito beatas) que, quando um jornal do continente publicava um artigo mais acintoso, Alberto João não era de modas e punha um processo de difamação. O objetivo não seria tanto ganhar como chatear. O crucial era que o processo desse entrada num tribunal da ilha.A princípio, jornalistas e diretores até achavam graça a apanharem de manhã o avião para irem a julgamento. Depois, pouco a pouco, a graça perdia a graça, pois começava a ficar cara. Sobretudo quando os réus batiam (perdão, bateriam) com o nariz na porta: um adiamento por um pretexto qualquer. Não sei se é verdade (corrijo: sei que não é) mas há aqui uma lógica cómica. Tradicionalmente, o acusado é que tenta desencantar formas de adiar a decisão. Ali seria a parte queixosa. Deve ser lenda mas, convenhamos, explicaria muita coisa.Gosto da Madeira e já perdi a conta às vezes que lá fui, em funções várias, não só pela poncha. Até já lá estreou uma peça minha de homenagem a um grande escritor local e universal, com encenação de Sara Gonçalves. Foi no teatro Baltazar Dias, por ocasião do centenário do nascimento de António Aragão em 2021.Não é incomodativo que o governo da região autónoma da Madeira seja do PSD. Até porque todos sabemos que no poder local a lógica partidária se subverte, sobretudo se os eleitos (sejam do CDS, da CDU, do PS ou do PSD) são gente séria e que ama a terra. No poder local, se todos se conhecem, também há mais proximidade dos eleitores aos eleitos. Mas, numa ilha, ser o mesmo partido há meio século? O mesmo clube, cor, clã? É quando o poder se revela fraqueza, com pés de bairro. E, como escreveu, Camões, “um fraco Rei faz fraca a forte gente”.

Onças geringonças
Boa sorte aos açorianos nas eleições de domingo. Que ganhe o melhor. E que, para governar, forme alianças quem as conseguir formar. A ver se os choramingas hipócritas do “O Costa perdeu e deu um golpe” ganham vergonha na cara e deixam de fingir que não conhecem as regras.Como perder a razão
“O que acontecer daqui para a frente é culpa do Governo”? “A paciência tem limites”? Convinha que os dirigentes dos polícias explicassem frases destas. É que, se o respeito pela autoridade é bonito, convém também as forças da autoridade terem respeito pela autoridade.Amores, aos tratores
500 milhões para ajudar os agricultores? Já nem sei se é muito, se é pouco. As chefias militares pedem bem mais, até porque terão de tornar as carreiras atraentes, além de munições. Só em publicidade sexy terão de gastar fortunas. Quanto aos professores, comprem tratores.

O pecador da semana 

Anda tudo muito nervoso. Ora eu acredito que a política também corresponde a estados de alma. Por exemplo, para mim, a paciência é democrática, a nervoseira é fascista. Esta semana, o caído em desgraça foi Rui Sinel de Cordes, que pecou. Ofendeu uma espectadora, e depois pediu desculpa. Por mim, desculpas aceites, até porque desaprovo linchamentos. E há dias, numa manifestação conotada com a esquerda, pelo direito à habitação, apareceu um cartaz a associar ‘senhorios’ a ‘judeus’. Ficaria bem numa qualquer purga medieval, prova de que mesmo quem se acha ‘prafrentex’ tem mais a ver com as vergonhas do passado do que julga.

Colarinho azul?
A corrupção é o crime mais fácil de apontar e o mais difícil de comprovar. O secretismo e a magnitude da Operação na Madeira sugerem que as forças policiais não confiam nas próprias forças policiais. Se a operação da PJ resultar em acusações firmes, que possam ir a tribunal em tempo útil, maravilha, será prova de que o sigilo funcionou. O mesmo para o caso do chefe de claque do Porto, por alcunha ‘Macaco’. Talvez com ele haja mais chances. É suspeito de pequeno crime, e o pequeno crime é sempre mais fácil de apanhar. Aliás, se Fernando Madureira for condenado, isso será a prova mesma de que se trata de pequeno crime.


Em Portugal todos se conhecem. Portugal é uma ilha, só que de um lado em vez de mar temos a Espanha, que também mete água. Ora a Madeira é um Portugal onde todos se conhecem ainda mais. Os turistas sempre a viram como destino paradisíaco.

A insularidade não é só vantagens, também tem um preço. Desde logo, é mais difícil ser oposição numa ilha.



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